Portadores de deficiência ganham apoio de voluntários



Amparo voluntário e projetos sociais são principais instrumentos de assistência aos portadores de deficiência

Quixadá. Na opinião de portadores de necessidades especiais e representantes de organizações não governamentais voltadas a esse tipo de assistência no Sertão Central as políticas públicas têm avançado nos últimos anos. Mas ainda é tímido o crescimento do processo de inclusão social dos grupos considerados especiais na região. Da falta de rampas para cadeiras de rodas à falta de compreensão, o compromisso familiar e a caridade de poucos são as principais garantias para quem necessita de um pouco mais de cuidado para atravessar a rua e seguir o caminho da vida.

Enquanto o Estatuto dos Portadores de Necessidades Especiais ainda tramita no Senado Federal em busca da integração social e do pleno exercício dos direitos individuais e coletivos para quem enfrenta limitações físico-motoras, mental, visual, auditiva ou múltipla, em busca da regular inserção social, sequer as normas relativas aos considerados normais são cumpridas. Se para quem tem visão já é difícil transitar pelas calçadas, invadidas por mercadorias e automotores, para quem não pode ver os obstáculos à sua frente, a tarefa se torna praticamente impossível de ser realizada.

Nesse ponto de vista, a presidenta da Associação dos Pais e Amigos de Pessoas Especiais de Quixadá (Apapeq), Vera Lúcia Carneiro, não acredita numa solução a médio prazo para o problema. Para ela, mãe de um rapaz portador de síndrome de Down, não bastasse o preconceito, ainda muito presente até dentro dos próprios lares, o descaso da população e dos governantes, com o cumprimento das normas legais, é o principal problema. Ela cita o trânsito como exemplo. Poucas regras são respeitadas. "Coisas assim ainda deixam os especiais muito distantes da verdadeira acessibilidade", avalia.

Vera Carneiro ressalta, porém, conquistas significativas como a implantação do primeiro Ponto de Arte Cultura e Tecnologia destinado a portadores de necessidades especiais. Com investimentos financeiros do Governo do Estado e o apoio da Secretaria de Educação de Quixadá, disponibilizando fisioterapeutas, fonoaudiólogas, psicopedagogas, psicóloga, professores, auxiliares de serviço e motoristas, 220 crianças e adolescentes, ainda 100 famílias, estão sendo contemplados com o programa diferenciado de inclusão. Para eles, o modelo funcionará como uma espécie de antídoto contra o preconceito.

Outra opção importante surgiu por meio de um projeto de inclusão digital realizado com recursos da Oi Futuro. Em parceria com o Sertão em Rede, o Centro de Referência de Inclusão Social da Criança e Adolescente (Crisca) acaba de promover o primeiro contato de um grupo especial de alunos com a informática. O aposentado Valdenir de Sousa Mourão é um deles. Ele perdeu a visão ainda na infância. Utilizando um programa especial viva-voz, teve o primeiro contato com o computador. Gostou da novidade.

"Essa sorte não é para todos", comenta a professora de braile,Graça Melo, preocupada com a carência dos portadores de necessidade visual de Ibaretama,vizinha a Quixadá. Por conta própria, ela passou a dar assistência a alguns deles. Se reúnem semanalmente na agrovila de Oticica, a cerca de 7km da sede do município. Além do ensino especial, a voluntária, como se considera, se empenha na criação de uma associação. Assim como na maioria das cidades do Ceará, não há nenhum tipo de assistência pública especial na cidade, garante.

A mesma realidade é enfrentada em Ibicuitinga. A inclusão está surgindo dentro das escolas, mas, segundo a professora Nazaré Castelo Branco, preocupados com a possibilidade dos filhos especiais serem maltratados, alguns pais resistem. Preferem mantê-los em casa. Outros, o fazem por exploração mesmo. De olho no benefício econômico concedido pelo Governo Federal, criam apenas como garantia de renda. Faltam humanidade, boa vontade.

ENQUETE

O que está faltando para quem tem necessidade especial?

Wagner Braga
60 ANOS
Cadeirante
Nós temos direitos como qualquer outra pessoa. Precisamos apenas que sejam respeitados

Marluce Andrade
30 ANOS
Deficiente auditiva
Precisamos apenas da paciência e da calma das pessoas para sermos compreendidos

Jerônimo Rabelo
54 ANOS
Deficiente visual
A cada ano surgem novidades para auxiliar na superação de nossos obstáculos. Precisamos ter acesso a elas

Mais informações
Apapeq: (88) 3414. 5583
Centro de Referência de Inclusão Social da Criança e Adolescente
(Crisca) : (88) 3412 .4030



VALE DO JAGUARIBE

Fábrica de sabão gera emprego e renda

Limoeiro do Norte.
Mesmo com as leis constitucionais para garantir acessibilidade e emprego, é na base do "faça você mesmo" que as pessoas com deficiência vão à luta, mostram a eficiência e traduzem o trabalho em dinheiro e cidadania. Falta representatividade aos grupos com deficiência nos municípios do Interior, mas onde há o esforço conjunto gera resultados. Para gerar emprego e renda, a associação das Pessoas com Deficiência de Limoeiro do Norte construiu uma fábrica de sabão. E para quem pensa que só querem ajudar a eles próprios, o altruísmo é para o meio ambiente. A pequena fábrica produz, semanalmente, cerca de 300 barras de sabão ecológico, feito com óleo de frituras que, não fosse para lá, poluiria o meio ambiente.

Devagar, mas firme, os passos de dona Maria Gizeuda Nogueira, de 45 anos, percorrem as calçadas, umas altas, outras baixas, e em frente de um número e uma porta, batendo palmas ou tocando na campainha, chama a atenção das donas de casa, principalmente as que precisam dividir o tempo pela manhã entre o fogão e a pia de louça. Gizeuda vende sabão de porta em porta, mas sua maior propaganda é mesmo o produto. Nem precisa ver para saber que o produto é bom. A vendedora é deficiente visual (perdeu somente aos 35 anos de idade), consegue uma renda ao final do mês vendendo as barras do sabão ´Limp´, fabricado pela Associação das Pessoas com Deficiência, da qual faz parte.

"O sabão é bom como uns todo, faz muita espuma que você precisa ver", afirma Raimunda Linete, cliente que só passava em frente à fábrica, e da calçada em que avistou a reportagem fez questão de fazer a propaganda. É nesse boca a boca que o sabão Limp já ganhou clientela nos supermercados da cidade. O sabão é feito com óleo de frituras, que seria jogado pelo ralo das pias e desde então só degradaria ainda mais o meio ambiente. Os solidários à causa social, e ambiental, têm a responsabilidade de armazenar o óleo que resta nas panelas, seja em cozinhas domésticas ou industriais. É o caso da Padaria São Francisco, cujo dono doou 300 litros de óleo para a produção do sabão.

O material é entregue a seu Antônio Gomes, que, mesmo com uma das mãos quase sem movimento, prepara a mistura na panela e corta 50 pedaços iguais de sabão nas bandejas. Todos os dias ele pedala mais de 12km de sua casa até a fábrica. Ao todo chega a produzir 1.200 barras de sabão por mês.

O projeto para construção da fábrica estava engavetado havia três anos, e graças ao recurso financeiro conseguido pelo Monsenhor João Olímpio com os amigos padres da Alemanha foi possível construir o empreendimento, que faz parte da Associação das Pessoas com Deficiência de Limoeiro e já é autossustentável. "O maior intuito é preservar o meio ambiente, não tem prazer maior que ver aquilo que não vai pelo ralo da pia", afirma Arnete Borges, presidente do Conselho dos Direitos da Pessoa com Deficiência e a maior líder dos direitos de acessibilidade. A associação existe desde 2005.

Foi com as denúncias e os alertas de Arnete, inclusive com reportagens do Caderno Regional, que muitas ruas de Limoeiro tiveram os obstáculos de cimento retirados, em nome dos cadeirantes e pedestres. "Existe ainda muita discriminação, muito preconceito contra o deficiente, mas ao ter oportunidade de perceber as ações que desenvolvemos, a visão muda".


COMPREENSÃO

É necessário respeitar as diferenças

Quixadá. Todos os dias Wagner Braga, 60 anos; Marluce Andrade, 30, e Jerônimo Rabelo, 54, enfrentam verdadeiras batalhas por um estilo de vida normal. Em comum, têm alguma necessidade, especial. O primeiro precisa apenas de vias bem pavimentadas para circular com sua cadeira de rodas, motorizada. A segunda, apenas se comunicar por meio de linguagem de sinais e o terceiro, precisa de um pouco mais, uma bengala e uma mão amiga. Para eles necessidades simples, como alguém considerado normal, a precisar de auxílio no caixa eletrônico.

Para eles, ainda há muito por fazer, mas a compreensão e respeito são as principais necessidades para o harmônico convívio social. O resto, enfrentam sozinhos. A tecnologia está ajudando. Não precisam de compaixão e nem de piedade.

Cumprimento de leis

A questão também não está na formulação de mais leis. Já existem muitas. É preciso apenas cumpri-las. Com educação, até mesmo um cego enxerga que não é correto estacionar numa rampa da calçada ou da porta do banco.

"O pior cego é aquele que não quer respeitar", diz Rabelo.

Quanto às políticas sociais, tem opiniões diferentes, voltadas para suas realidades. Apesar de contar com uma situação econômica satisfatória, o cadeirante aponta a melhor estruturação urbana, com vias adequadas ao trafego de cadeiras-de-rodas como necessidade básica.

A instrutora de Libras discorda do processo de inclusão para surdos-mudos implantado nas escolas. Prefere a formação de turmas especiais pelo menos no Ensino Fundamental. O deficiente visual vê como alternativa para seus obstáculos no dia a dia a demarcação em relevo das calçadas, sinalização sonora e também indicação em braile nos cruzamentos.



Fonte: www.diariodonordeste.com.br

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